terça-feira, 1 de julho de 2014

Janela para conversa à meia-noite / Sobre dor, escrita e talvez, pássaros

          No tempo da dor, escrever é difícil. Qualquer palavra soa tortuosa, rouca, sem som. A metáfora gerada no meio do sofrimento é forte, brava... poética. Mas só dentro de nós mesmos, dentro de nossas mentes, dos nossos peitos carregados. Fora de nós: seja no papel, na parede ou escrita em letras de vento na voz, ela soa gasta, fútil, clichê. Como é possível tal mudança? Tal distorção? Se o céu for o sofrimento sentido, a dor desgraçada; as palavras escritas são como pássaros de asas arrancadas. Pássaros criados, gerados, desenvolvidos unicamente para voar, mas que por um acaso, engano ou maldição mal chegam a abraçar o vento.

          Mas talvez, só talvez, esse mal seja realmente necessário. É preciso que a dor primeiro passe para que ela seja sentida novamente. Afinal, escrever é fazer doer de novo, romper suturas, revelar fraturas. É ver a feiura da dor não lembrada, mas jamais esquecida. Para escrever talvez seja necessário que, primeiro, as lágrimas caiam, os gritos ecoem e as almas sofram. Pra depois, quando surgir a tão famosa calmaria pós-tempestade, possa-se relembra tudo de novo, mas sem os excessos... De forma igual e diferente. Talvez, só talvez, escrever seja re-doer. 

- F.A.R.S